top of page

HOMEOSTASE DAS CÉLULAS

Como criar uma unidade entre todas as áreas de intervenção e pré-existências? Como manter as características do bairro e, ao mesmo tempo, proporcionar qualidade urbana? Questionamentos como esses nos levaram a desenvolver uma maquete de todo o bairro, com o propósito de olhar para cada célula* em particular e para todas em conjunto, como os sistemas do corpo de um ser vivo.

*célula, aqui, se refere às áreas de intervenção
 

“Os conceitos de 'público' e 'privado' podem ser interpretados como uma tradução em termos espaciais de 'coletivo' e 'individual'. Num sentido mais absoluto, podemos dizer: pública é uma área acessível a todos a qualquer momento; a responsabilidade por sua manutenção é assumida coletivamente. Privada é uma área cujo acesso é determinado por um pequeno grupo ou por uma pessoa, que tem a responsabilidade de mantê-la” (Hertzberger, 1973).
 

Conforme o estudo conceitual, nossa proposta de organicidade tem como objetivo intervir no bairro, promovendo qualidade urbana, porém sempre atentando às pré-existências e dinâmicas locais, sempre olhando as partes em relação ao todo e vice-versa. Com base nisso, tomamos decisões sobre a forma prática como iríamos intervir em cada local, proporcionando espaços que transmitissem a identidade do bairro, a fim de gerar apropriação destes. Exemplo disso foi nossa decisão em manter a dinâmica de rua/espaço público como local de encontro dos vizinhos e habitações como áreas mais privadas; conservar a baixa verticalização do bairro; trabalhar com circulações verticais através do morro - no presente há presença de escadas que fazem essa conexão, no entanto, pretendemos também viabilizar a acessibilidade por meio de rampas e transporte funicular.

Propostas de intervenção:

  • 1. Clube do Penhasco: centro comunitário com espaço de convivência na área externa.

  • 2. Terreno na beira d'água: praça pública que possibilita encontro e renova o contato com o mar; serviços e banheiros públicos.

  • 3. Terreno ao lado do Hotel Veleiros: museu da história da urbanização do eixo norte-sul da ilha; mirante; ligação com a praia.

  • 4. Iate Clube: abertura do clube transformando-o em área pública e terminal marítimo e intermodal.

  • 5. Antiga fábrica da Coca-cola (projeto de implantação de uma escola no terreno): criação de parque de preservação nas áreas onde há mata nativa, sendo ela Área de Preservação Permanente ou Área Turística de Lazer, que interliga a comunidade do topo do morro com a escola, com os serviços próximos a ela e com o resto do bairro.

  • 6. Deck-mirante: valorizar o potencial do local com colocação de serviços central de informações ao turista, academia ao ar livre e banheiros públicos.

  • 7. Anel viário: Dar vitalidade urbana à área por colocação de conjunto habitacional e parque público, aliado a instauração de serviços, auditório-teatro, centro poliesportivo, posto de saúde, horta comunitária, SESC, museu de memória da praia e da pesca, terminal intermodal com transporte funicular conectando a comunidade do morro com a cidade e transporte marítimo conectando com a marina e vila dos pescadores.

  • 8. Comunidade no topo do morro: colocação de uma biblioteca e mirante; conexão com o anel viário e com o parque de preservação e escola por meio de transporte funicular; possibilitar fácil locomoção para o sopé do morro, a fim de conectar comunidades e permitir apropriação dos espaços.

  • Praia: melhorar balneabilidade.

  • Conexões: 1. restabelecer ligação com a orla; 2. conectar as ruas verticalmente entre si; 3. conectar o todo (acessos terrestre e marítimo ao bairro - área do anel viário com bairro e topo do morro - topo do morro com bairro e área verde - área verde com bairro, topo do morro e anel viário).

  • Percurso horizontal: melhoria da acessibilidade e caminhabilidade; redução da velocidade máximas nas vias principais; colocação de ciclovia ou ciclofaixa; respiros com áreas de descanso e sombra.

Âncora 1

IMPLANTAÇÃO NOS TERRENOS

Começamos pensando na volumetria buscando criar harmonia com o entorno, respeitando a baixa verticalidade do bairro, possibilitar os caminhos de conexão que consideramos importantes nos terrenos selecionados e criar também espaços livres entre as edificações, que podem funcionar como praças públicas, utilizadas não só pelos moradores, mas pela comunidade como um todo. Para tal, selecionamos três terrenos estratégicos que conectam diferentes elementos do bairro (orla-rua, rua-rua e rua-área verde), além de se conectarem entre si, formando, no bairro, um circuito que será explicado melhor mais a frente.

 

Então, com um início de volumetria pensada, começamos a trabalhar no SketchUp, verificando a utilidade dos espaços, bem como a ventilação e a iluminação. Assim, estabelecemos quais blocos formariam apartamentos, começando a pensar na planta baixa, e quais seriam circulação e serviços, trabalhando com diferentes esquemas de cores. Nesse processo, fomos e voltamos muitas vezes, da escala maior para menor, para construir habitações que funcionem enquanto unidade e também enquanto conjunto.

 

Ao final desse processo, chegamos em resultados diferentes para os três terrenos trabalhados.

 

O primeiro terreno, que conecta a orla à rua Silva Jardim, é composto por um relevo que permitiu a colocação de prédios de até quatro andares sem ultrapassar o nível da rua. Sendo assim, criamos três blocos habitacionais acessados por cima compostos por apartamentos de dois e três quartos. A circulação no terreno foi pensada através de um funicular central, além das escadas dos blocos. Devido a localização estratégica do terreno, valorizou-se a área pública neste, com a colocação de um espaço de exposições, de duas praças entre os blocos e de um caminho acessível até a orla.  

Já no segundo terreno, que conecta as ruas Silva Jardim e Profa. Maria Júlia Franco, tendo este uma topografia mais acidentada, foram colocadas habitações de dois e três quartos de, no máximo, três pavimentos, respeitando a topografia e verticalização do entorno. Essas moradias seriam acessadas não por módulos de circulação interna, mas pelo lado externo de cada uma delas, ao longo de uma passagem criada para conectar as ruas, acessível por transporte funicular.

Por fim, no terceiro terreno, que cria uma conexão da rua Profa. Maria Júlia Franco com a área verde de preservação, foram priorizados tanto o caminho que cria essa ligação, tornando-o acessível por meio de transporte funicular, como esse caráter público e de integração com o parque de preservação a ser instaurado. Foram pensadas habitações acessadas por fora, devido também à elevada declividade da área, que tornou difícil implantação de uma habitação multifamiliar de grande escala. As moradias mais próximas do nível da rua e outras ligadas pelo funicular seriam acessíveis. Trabalhou-se com moradias compartilhadas, sendo os cômodos de convivência compartilhados por 5 quartos, podendo estes comportar até duas pessoas.

A partir desses estudos iniciais de implantação, definimos como seria a dinâmica coletivo-individual de cada terreno e voltamos para a macro-escala do bairro, com o intuito de definir melhor como tudo se interligaria.

Âncora 2

CONEXÕES URBANAS

Primeiro, analisamos a escala do pedestre, melhorando os acessos na região da entrada do túnel, que conecta o centro ao bairro José Mendes. A fim de melhorar a caminhabilidade, adicionamos faixas de pedestre onde possível e, nas vias de alta velocidade, que dão acesso ao túnel, propusemos passarelas, que ligariam inclusive a vila dos pescadores à essa nova área do anel viário. Nele se instalariam serviços, uma espécie de praça pública e terminal intermodal (ligação entre transporte viário, marítimo, funicular e cicloviário), além de, considerando a pré-existência de um campinho de futebol criado pela comunidade, criar o Complexo Cultural-Esportivo José Mendes, que estaria espalhado pelo bairro com atrações culturais e esportivas. Todas essas modificações trariam vitalidade à essa área esquecida e convidariam os moradores a se apropriarem do espaço público próximo à orla.

A conexão com o morro se deu por melhorias das vias por todo o bairro e por instauração de um funicular que subiria até o topo do morro, com paradas periódicas. Além disso, nessa região do bairro, propõe-se a colocação de uma das partes do complexo cultural-esportivo, por meio de uma biblioteca, ateliês de trabalho e mirante.

Para as vias, pensou-se em diminuição da velocidade máxima nas ruas Silva Jardim e Profª. Maria Júlia Franco, e mudanças no sentido de tráfego. A Rua Profª. Maria Júlia Franco iria apenas no sentido centro e a rua Silva Jardim teria uma pista sentido bairro no trecho entre o anel viário e a Igreja. No ponto onde elas se juntam para formar a rua José Maria da Luz, haveria duas pistas, uma com sentido de ida e outra de volta. Sobre a dinâmica das calçadas, seguiu-se o modelo do projeto de intervenção urbanística do IPUF, que separa a ciclovia por canteiro com árvores, melhora a qualidade das calçadas e cria "respiros" de sombra e permanência ao longo das vias.

Por fim, constitui-se um circuito ao longo das centralidades pré-existentes e outras criadas no bairro. Esse circuito fica evidente na região próxima aos três terrenos em que estamos trabalhando, pois eles conectam a orla à rua Silva Jardim; esta à rua Profa. Maria Júlia Franco; esta ao parque de preservação da área verde, que é ligado por meio de vias acessíveis à escola a ser instaurada no terreno da antiga fábrica da Coca-Cola e também às ruas verticais que sobem o morro (Rua São Judas Tadeu, Servidão João Honorato Soares e Rua Prof. Aníbal Nunes Pires); além das ruas principais do bairro, que já compõem uma conexão horizontal deste. Também fizemos uma estimativa da densidade de pessoas que irão habitar os terrenos. Nossa proposta abriga, em média, 352 pessoas, sendo aproximadamente 23m² por habitante.

Mapa de manchas de centralidade

Mapa de manchas de centralidades

Assim, trabalhamos com diversas escalas: da cidade, do morro (área verde e comunidade localizada no morro), do bairro como um todo, da rua, do conjunto habitacional/terrenos, da habitação e dos módulos. Fomos indo e voltando entre gradientes da macro e da micro escala, para que a proposta tivesse unidade com nossas intenções. Assim, retornamos a trabalhar nos módulos, entrando em aspectos mais minuciosos como acessos, aberturas e circulações.

EVOLUÇÃO PROJETUAL

Âncora 3

Optamos por nos aprofundar no desenvolvimento de um projeto para o primeiro terreno, devido à sua localização estratégica.

Algumas intenções projetuais foram repensar a relação do terreno com a água e criar espaços de permanência de qualidade. Para conectar e vencer o desnível existente entre a rua e a borda d’água, colocamos – além de uma escadaria – um funicular central que garante acessibilidade ao terreno.

Nos espaços livres entre os blocos criamos pequenos pátios com áreas de permanência com bancos, mesas, arquibancada, gramado e sombra

Buscando resgatar a conexão dos moradores com o mar, criamos um espaço de lazer na borda, com um espaço com areia e esguichos d’água para crianças e uma arquibancada na margem do terreno, que inunda conforme as mudanças de maré.

Esse espaço conecta o terreno com o já existente trapiche do navio Casa Blanca, o qual será restaurado, possibilitando a chegada de barco ao terreno. A partir deste criamos também outros dois trapiches, um conectado à marina e outro ao terreno em frente ao clube do penhasco. Assim incentivando ainda mais o uso deste espaço público por moradores do bairro como um todo.

Em nosso projeto, optamos por priorizar os ciclistas e pedestres. Assim, além da revitalização das calçadas e da ciclofaixa, colocamos bicicletários logo na entrada do terreno, que podem ser usados por moradores e visitantes.

Os apartamentos são acessados através de escadas (e elevador, em um dos blocos) tanto pelo nível da rua quanto pelo nível da orla. Os corredores que ligam os blocos com a rua configuram-se também como áreas de permanência, de onde se pode observar o terreno como um todo. E em dois dos blocos eles terminam em terraços, que serão espaço de lazer.

O sistema construtivo escolhido para os prédios foi o Light Steel Framing (com exceção das escadas, que são metálicas). Como desde o ínicio vínhamos trabalhando com uma modulação, foi fácil encaixá-la a modulação dos perfis de aço. Assim, pudemos trabalhar com esse sistema industrial, que facilita a reprodução do modelo de projeto que aplicamos neste terreno para os demais, conforme a demanda do bairro. Para o fechamento externo dos perfis optamos por placas cimentícias, além das camadas de lã de vidro e isolante térmico, com revestimento cerâmico, que possui alta resistência à umidade. Para o fechamento interno optamos por gesso acartonado nas áreas secas e revestimento cerâmico nas áreas molhadas.

Algumas paredes internas não são estruturais, o que permite que os usuários tenham a liberdade de realizar algumas mudanças no layout interno do apartamento, como aumentar ou diminuir cômodos. Ainda, alguns apartamentos contam com as varandas - módulos expansíveis - que podem ser transformadas em cômodos de acordo com as necessidades dos moradores.

Os layouts internos foram pensados considerando questões de conforto ambiental. Priorizamos a colocação dos quartos na fachada norte dos blocos e nos atentamos para proporcionar luz natural em todos os cômodos. As aberturas foram definidas respeitando a modulação da estrutura em steel frame. Desta maneira, sem alterar a estrutura, criamos aberturas para os diferentes tipos cômodos (quartos, banheiros, áreas comuns e lavanderias) e as posicionamos de modo a proporcionar o melhor conforto possível em cada planta.

bottom of page